Na última quarta-feira (16), o presidente do Sindilegis Nilton Paixão, acompanhado da 2ª vice-presidente da entidade, Lucieni Pereira, do procurador do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União e Secretário-Executivo da Associação Nacional do Ministério Público de Contas (Ampcon), Júlio Marcelo de Oliveira, do Procurador da República, André Stefani Bertuol, e das representantes do Andes*, Bartira Silveira Grandi, e do MCCE/Unasus**, Jovita Rosa, estiveram no Gabinete do Presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), Ministro Benjamin Zymler, ocasião em que fizeram alerta sobre os riscos da Medida Provisória nº 520, de 2010, que autoriza o Poder Executivo a criar a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares S.A (Ebserh), entidade de natureza privada que funcionará como uma espécie de "central" dos hospitais-escola de 45 Universidades federais autônomas.
Na seqüência, enquanto 4 mil servidores de todo país protestavam na Esplanada dos Ministérios contra o PLP 549 e a MP 520, o grupo foi recebido pelo senador Pedro Taques, ex-Procurador da República eleito pelo PDT de Mato Grosso. Durante a audiência com o senador, o grupo alertou sobre os riscos da MP 520 e pediu seu apoio na abertura do debate no âmbito do Congresso Nacional. Para tanto, foram entregues documentos técnicos produzidos por um grupo de especialistas em direito, saúde, educação e finanças públicas, além dos Manifestos Coletivos e da Moção Coletiva assinada por várias entidades representativas e organizações da sociedade civil contra a MP e a favor da criação da Frente Parlamentar Suprapartidária em defesa do Sistema Único de Saúde (SUS), o que está sendo coordenado pelo Deputado Dr. Rosinha (PT/PR).
"O objetivo é criar um canal para tornar o Poder Legislativo mais permeável à participação da sociedade nas discussões sobre saúde e suas práticas de gestão, ou seja, uma reaproximação com os movimentos sociais. Temas como a MP 520 e a regulamentação da Emenda nº 29, de 2000, serão alguns dos assuntos a serem debatidos no âmbito da Frente Suprapartidária", declarou Lucieni Pereira.
O presidente Nilton Paixão nomeia a MP 520 não como um processo de privatização, mas sim de "privataria", inconcebível à luz da Constituição de 1988 que inaugurou o Sistema Único de Saúde (SUS) como patrimônio social. "O Sindicato não faz só defesa corporativa. Estamos sempre ao lado da reconstrução dos espaços públicos. Defender o SUS é defender a própria noção de dignidade humana que é o fundamento do Estado Democrático de Direito", explicou.
Riscos
Durante a audiência, Lucieni Pereira chamou a atenção para os impactos e riscos econômicos, fiscais e sociais da MP. "A Ebserh vai ser uma empresa que irá definir o rumo dos hospitais-escola, de forma apartada da Universidade (autarquia), dotada de autonomia didático-científica, administrativa, financeira e patrimonial, além de estar sujeita ao princípio constitucional da indissociabilidade do ensino, da pesquisa e da extensão". De acordo com a vice-presidente, em 2006, o TCU, por meio do Acórdão nº 1.520-Plenário, fixou um prazo para que o Poder Executivo da União realizasse os concursos, nos termos da Constituição, para resolver a situação dos terceirizados até 31 de dezembro de 2010, data da edição da MP 520.
O Procurador da República, André Bertuol, ressaltou a existência de outras questões no que se refere à MP-520. "É um regime próprio de licitação, com contratação de pessoal segundo processo simplificado e regido pela CLT, fora dos eixos estruturantes da transparência e do controle, como o orçamento público, o "teto remuneratório", os limites fiscais, os sistemas corporativos como o Siafi e o Siape. É como se a empresa explorasse atividade econômica a exemplo da Petrobrás, do Banco do Brasil e outras empresas mantidas com receitas da exploração das respectivas atividades econômicas em livre mercado, sem receber recursos dos orçamentos públicos provenientes de tributos", explicou.
Bertuol também compartilhou com o senador sua preocupação em relação aos riscos de dilapidação dos bens públicos da União transferidos à Ebserh e a outras entidades de natureza privada que venham a ser criadas com mesma finalidade, as quais passariam a receber tratamento próprio do setor privado, sem as proteções constitucionais que asseguram a impenhorabilidade do patrimônio público e, em contrapartida, a inclusão dos débitos da Fazenda Pública na lista de precatórios com vistas a garantir os direitos dos fornecedores de bens e serviços ao Estado. "O meio, definitivamente, não é adequado. Com tantos impactos, de ordem econômica, orçamentária, financeira, administrativa e patrimonial, um tema como esse jamais poderia ser inaugurado por uma medida provisória precária em sua essência", finalizou o Procurador do Ministério Público Federal.
Bartira (Andes – Regional Sul) ressaltou o risco de comprometimento da pesquisa nas universidades, uma vez que muitas são desenvolvidas nos hospitais universitários. "Com essa empresa estatal gerenciando os hospitais-escola, muitos projetos de pesquisa podem ser preteridos por não atenderem aos objetivos de produtividade e geração de recursos, pensamento característico de entidades de natureza privada. Esse modelo afronta os princípios constitucionais da autonomia universitária e da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão nas atividades acadêmicas da universidade, pois o olhar privado deste gerenciamento pretendido certamente levará ao afastamento da comunidade acadêmica das atividades ali desenvolvidas. O problema de dois regimes de contratação de servidores, com remunerações diferenciadas para mesmas atividades, coexistindo na mesma instituição, é outro que não pode ser esquecido", alertou a representante do Andes.
Lucieni Pereira também lembrou os perigos do modelo remuneratório proposto pelo artigo 29, inciso I da minuta de lei orgânica da administração pública elaborada por uma Comissão de Juristas instituída pelo Ministério do Planejamento em 2007. "O dispositivo pretende autorizar, no contexto do contrato de autonomia gerencial, a concessão de bônus para servidores ativos, de natureza eventual, vinculado ao cumprimento do contrato, a título de prêmio, sem incorporação à remuneração, o que certamente precarizará a estruturação das carreiras nas áreas contempladas por entidades estatais de direito privado, criando fosso inaceitável entre ativos e inativos", comenta.
"Embora o conteúdo dessa minuta dos Juristas tenha sido alvo de duras críticas do Ministro Jorge Hage e por meio da Nota Técnica nº 7, de 2010, da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e Lavagem de Dinheiro (Enccla), o seu núcleo foi aproveitado e inaugurado pela MP 520, sem o devido debate com os setores diretamente afetados pela "reengenharia" que se pretende fazer na administração pública por meio infraconstitucional, o que é altamente discutível", concluiu a segunda vice-presidente do Sindilegis.
Jovita Rosa (Unasus/MCCE) informou ao senador que os serviços a cargo do SUS, universais e gratuitos, não têm como ser prestados por empresa de natureza privada mantidas com recursos do orçamento público, pois, além de afrontar os pressupostos constitucionais que norteiam o referido Sistema, a privataria abre oportunidade tácita para a cobrança indevida de tais serviços, em geral recorridos pela parcela mais carente da população.
Ao encerrar a reunião, o senador Pedro Taques se comprometeu a inserir o tema em sua pauta de atuação parlamentar. "Irei acompanhar esta questão na Câmara junto ao deputado Dr. Rosinha, além de procurar discutir o tema em comissões", concluiu.
PGR
No final da tarde, o grupo seguiu para a Procuradoria-Geral da República com o mesmo objetivo: entregar o texto técnico conjunto sobre a MP 520, além dos Manifestos Coletivos assinados por várias entidades que representam as categorias da educação, saúde e controle, e de organizações da sociedade civil, todas contrárias à MP em referência.
Juntamente com o Procurador da República, André Bertuol, os representantes já citados, o Presidente do Instituto "A voz do Cidadão", Jorge Maranhão, e o presidente da Associação Nacional do Ministério Público de Defesa da Saúde (AMPASA), Jairo Bizol, participaram de audiências com os Subprocuradores-Gerais da República, Dr. Aurélio Rio Veiga e Dr. Antônio Fonseca, da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) e da 3ª Câmara de Coordenação e Revisão (3ª CCR - Consumidor & Ordem Econômica), respectivamente.
Após ouvir todos os participantes, o Subprocurador-Geral, Dr. Aurélio Veiga, disse que, antes de tudo, será preciso aprofundar o debate. "Recomendo a articulação de um grande seminário para discutir o tema", sugeriu.
O grupo finalizou a agenda do dia em audiência com a Vice-Procuradora-Geral da República, Drª Deborah Macedo Duprat de Britto Pereira, que recebeu o texto conjunto elaborado por especialistas, Manifestos e Moção Coletivos. Na ocasião, a Vice-Procuradora-Geral entregou ao Procurador da República, Dr. André Bertuol, a íntegra do parecer ofertado na ADI n 4197 impetrada pelo Conselho Federal da OAB em face de Leis que criaram fundações estatais pelo Estado de Sergipe, para o qual o Bertuol fornecera subsídios. Os documentos também foram entregues à 5ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal (5ª CCR - Patrimonio Público e Social), perante a qual Bertuol responde como relator especial para os assuntos relacionados à criação do novo figurino de fundações estatais de direito privado e entidades congêneres (empresas e subisidiárias de natureza privada) para prestação de serviços públicos universais e custeados com recursos dos orçamentos públicos provenientes de tributos.
*Andes – Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior
**MCCE – Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral / Unasus – União Nacional dos Auditores do Sistema Único de Saúde
Manifesto Coletivo Contra a Privataria | |
Manifesto contra a MP 520 | |
Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro - ENCCLD | |
Tema em Debate - Medida Provisória 520/2010 Fonte: http://www.sindilegis.org.br/conteudo/texto.asp?tipo=NoticiaSind&id=892914933289158145571415 |
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