RIO — O Ministério Público Federal expediu, no último dia 1º, uma recomendação à Unirio para debater os aspectos positivos e negativos de uma possível adesão à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), antes de decidir passar para ela a gestão do Hospital Gaffrée e Guinle, ligado à instituição universitária. A Ebserh foi criada pelo governo federal em 2011 como forma de melhorar a gestão dos seus hospitais universitários. Agora, qualquer contratação nessas unidades só pode ser feita por intermédio dela, que é uma empresa pública de direito privado.
A decisão final da Unirio cabe ao Conselho Universitário (Consuni). Segundo o documento enviado para o reitor da universidade, o tema deve ser esclarecido e debatido com professores, técnicos administrativos e estudantes, assim como com pacientes do hospital e cidadãos em geral. É recomendado ainda que haja uma audiência pública.
A procuradora da República Roberta Trajano, que acompanha o caso, ressalta que um documento da Ebserh enviado às universidades federais tem contradições. Nele, a empresa nega que seja obrigatória a adesão ao novo modelo de gestão, pois todas as instituições continuarão recebendo recursos do governo. Contudo, afirma que “as universidades que não aderirem à empresa não terão condições de cumprir” um acórdão do TCU, de 2006. Isso porque o tribunal determinou na época a demissão de funcionários terceirizados, contratados temporariamente. Mas, para repor essa mão de obra agora, é preciso que as universidades fiquem sob a gestão da Ebserh.
— Isso não deixa de ser uma forma de pressão — afirma a procuradora.
Unirio diz que assunto é discutido desde 2012
Em nota, a Unirio informou que a reitoria já vem debatendo, desde 2012, a entrega da gestão do Hospital Gaffrée e Guinle à Ebserh. Anteontem, o Conselho Universitário realizou uma sessão, sem caráter deliberativo, com a presença de autoridades federais das áreas de educação e saúde, além de um representante da empresa. Há um calendário de debates previsto até 25 de setembro.
Tarcísio Rivello, diretor-geral do Hospital Universitário Antonio Pedro, da UFF, concorda com a procuradora da República Roberta Trajano: há pressão para que as instituições aceitem a gestão da Ebserh. Ele diz ser contrário à adesão. Os principais motivos alegados são a centralização de poderes na empresa e a forma de contrato por tempo indeterminado:
— Há uma pressão que, dentro de um Estado democrático, não deveria acontecer. Isso é coação. O contrato é por tempo indeterminado e leonino, porque todas as questões estão concentradas no escritório central da Ebserh, em Brasília. Não aceito isso.
Já a UFRJ formalizou uma pré-adesão à Ebserh,para que fosse iniciado o dimensionamento de pessoal e de serviços para a contratação da empresa. A universidade ainda está finalizando a discussão no Conselho Universitário, mas o reitor Carlos Levi e a Congregação de Medicina já se mostraram favoráveis à adesão.
Ação no STF contra lei
Segundo a procuradora Roberta Trajano, os repasses de verbas do Programa Nacional de Reestruturação dos Hospitais Universitários Federais, do Ministério da Educação, atrasaram em 2012 e este ano. A primeira parcela, que tem pagamento previsto para maio, só foi paga no segundo semestre nos dois anos. O MPF instaurou um procedimento para apurar os atrasos.
— Com esses atrasos, as diretorias não têm como se planejar e isso afeta a gestão. O sucateamento dos hospitais universitários não é de hoje, ele ocorreu ao longo das últimas décadas. O problema é que agora está servindo de justificativa para uma mudança, que precisa ser amplamente debatida — disse Roberta.
Quando criou a Ebserh, o governo federal disse que ela garantiria mais agilidade nas contratações, pois seriam feitas pelo regime da CLT. Com isso, por exemplo, demitir profissionais seria mais fácil. Houve, no entanto, baixa adesão dos hospitais ao novo modelo. Muitos profissionais o repudiam, temendo pelo fim da autonomia das unidades universitárias. Além disso, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, considerou a lei que criou a Ebserh inconstitucional, por atribuir à empresa a prestação de um serviço público. Gurgel ajuizou uma ação no STF, que ainda não foi julgada.
Entenda o que é a Ebserh
A criação da Ebserh foi apresentada pelo governo federal, em dezembro de 2011, como a forma de melhorar a gestão dos hospitais universitários, que já enfrentavam graves problemas. A empresa pública de direito privado garantiria mais agilidade às contratações uma vez que as faz em regime de CLT.
Repudiada por muitos profissionais do setor, que temem pelo fim da autonomia dos hospitais universitários, a iniciativa também encontrou resistência do procurador-geral da República, Roberto Gurgel. Ele considera a lei que criou a Ebserh inconstitucional, o que o fez ajuizar uma ação no Supremo Tribunal Federal.
A baixa adesão impede a especialista em gestão hospitalar Ana Maria Malik, coordenadora da GV Saúde, a realizar uma avaliação a respeito da implantação da empresa nos hospitais universitários. Ainda assim, ela ressalta que não vai ser o modelo de gestão que vai resolver ou atrapalhar o bom funcionamento das unidades:
— Um modelo de gestão, uma figura jurídica, o tipo de organização não resolve nem impede nada. É preciso, sim, ter pessoas comprometidas à frente das instituições, interessadas nos pacientes e não por outra questão qualquer. Essa me parece ser apenas mais uma tentativa, mas ainda não temos como avaliar se vai ser bem sucedida ou não.
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