http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff1008201001.htm Folha de São Paulo, 10/08/2010
Município pede orçamento para supervisão de hospitais terceirizados
Folha teve acesso a proposta encomendada a fundação privada; oficialmente, prefeitura nega esse projeto
RICARDO WESTIN
DE SÃO PAULO
A Prefeitura de São Paulo estuda a contratação de uma empresa para auditar as prestações de contas das OSs (organizações sociais privadas) que recebem verba pública para dirigir hospitais e postos de saúde municipais.
A Folha teve acesso à proposta de auditoria feita neste ano, a pedido da Secretaria Municipal da Saúde, pela fundação privada Fipecafi.
Oficialmente, a secretaria nega o plano de implantar a auditoria, mas não contesta a informação de que encomendou o orçamento à Fipecafi.
A decisão de buscar uma fiscalização externa tem origem na dificuldade enfrentada pelos auditores municipais para verificar se as OSs estão aplicando os recursos públicos adequadamente.
Num relatório recente, o Tribunal de Contas do Município descreveu os auditores como "escasso quadro técnico" e de trabalho "falho e ineficiente". A prefeitura não diz quantos são na equipe.
No ano passa do, as OSs receberam cerca de R$ 1,4 bilhão para gerenciar UBSs (postos de consulta), AMAs (postos de pronto-atendimento), hospitais, laboratórios de exames e equipes do Programa Saúde da Família.
O orçamento total da secretaria foi de R$ 5,3 bilhões.
As auditorias também são dificultadas pelo fato de as OSs enviarem suas contas em folhas de papel. A empresa que for contratada terá de informatizar o sistema.
ULTRASSOM E RAIO-X
Em abril, um grupo de vereadores vistoriou o hospital municipal São Luiz Gonzaga, no Jaçanã (zona norte), e descobriu que a OS Irmandade da Santa Casa de São Paulo não vinha realizando ultrassons e raios-X no hospital, apesar de receber para isso R$ 1 milhão por ano.
"As OSs fazem o que querem", diz a vereadora Juliana Cardoso (PT), da Comissão de Saúde da Câmara.
Segundo a Irmandade Santa Casa, o hospital do Jaçanã não tem feito todos os exames por falta de pacientes que precise m deles.
A Secretaria da Saúde afirma que tem bom controle sobre as parcerias. "Todos os contratos são acompanhados com rigor. Uma equipe acompanha e analisa os resultados de acordo com as metas estipuladas."
E acrescenta: "A cada três meses, a Comissão Técnica de Acompanhamento avalia a produção, a qualidade e as informações em geral sobre os serviços [unidades de saúde]. São observados aspectos financeiros da atuação da instituição parceira [OS]."
Para pesquisador, auditoria é um avanço
José Mendes Ribeiro, da Fiocruz, diz que o maior controle ajudará a preservar o próprio sistema de terceirização
OSs fazem prestação de contas mensais, mas, para a Promotoria, conferência deveria ser mais minuciosa
DE SÃO PAULO
A Prefeitura de São Paulo fará um avanço importante se contratar uma auditoria para verificar os gastos das OSs, avalia o pesquisador José Mendes Ribeiro, da Ensp/ Fiocruz (Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz).
Para Ribeiro, a auditoria externa é necessária porque a crescente terceirização de hospitais e postos de saúde pode "ameaçar esse modelo de gestão da saúde pública".
"Quando há poucos contratos, o poder público consegue olhar minuciosamente cada um. Quando o modelo se massifica e os contratos se multiplicam, o poder público perde essa capacidade de controle", explica.
Os primeiros convênios da Prefeitura de São Paulo com as OSs foram assina dos em 2001. Hoje, dirigem ao redor de 250 estabelecimentos.
Ribeiro ressalta ser essencial que o resultado das auditorias se torne público: "Precisa haver transparência".
O promotor Arthur Pinto Filho, do Ministério Público do Estado de São Paulo, também diz apoiar essa possibilidade. A Promotoria, aliás, tem ações ajuizadas contra a Secretaria Municipal da Saúde em que pede mais controle nas parcerias.
"A prefeitura não tem condições de fazer o controle. São pouquíssimos os funcionários. As contas chegam, mas fazem só uma conferência formal. Não olham detalhadamente", diz.
Ele exemplifica: "Quanto a OS paga, com dinheiro público, por um esparadrapo? Muito? Pouco? Não sabemos. É um perigo, já que as OSs não compram por licitação".
Até agora, 24 entidades receberam da Secretaria Municipal da Saúde o título de OS.
CONTROVERSO
As OSs são entidades privadas sem fins lucrativos. Quando assume m um hospital, ficam obrigadas a atingir metas de consultas, exames e cirurgias.
E, para cada unidade de saúde, fazem uma prestação de contas mensal. A OS enumera o gasto com remédio, salário de médicos, exame, material de limpeza etc.
A parceria com OSs surgiu no Brasil no final dos anos 90 e atualmente é adotado por vários Estados e prefeituras.
Entidades como o Banco Mundial dizem que esse modelo é mais ágil e econômico.
Quando é dirigido pelo poder público, o hospital precisa abrir licitação para comprar, concurso para contratar e sindicância para demitir.
Com as OSs não. Assim, as unidades de saúde públicas terceirizadas resolvem seus problemas com rapidez.
O modelo, por outro lado, é criticado por entidades como o Conselho Nacional de Saúde. Citam a falta de controle sobre a verba pública.
O Supremo Tribunal Federal deverá julgar uma Adin (ação direta de inconstitucionalidade) que questiona as parcerias com as OSs.
(RICARDO WESTIN)
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